sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Billie Holiday- The Man I Love


Pura Poesia VII Vinicius de Moraes- Eu Sei Que Vou-te Amar



Eu sei que vou te amar
Por toda a minha vida, eu vou te amar
Em cada despedida, eu vou te amar
Desesperadamente
Eu sei que vou te amar

E cada verso meu será
Pra te dizer
Que eu sei que vou te amar
Por toda a minha vida

Eu sei que vou chorar
A cada ausência tua, eu vou chorar
Mas cada volta tua há de apagar
O que esta tua ausência me causou

Eu sei que vou sofrer
A eterna desventura de viver
À espera de viver ao lado teu
Por toda a minha vida


Amor- Maria Teresa Horta

Invocação Ao Amor

Pedir-te a sensação
a água
o travo

aquele odor antigo
de uma parede
branca

Pedir-te da vertigem
a certeza 
que tens nos olhos
quando me desejas

Pedir-te sobre a mão
a boca inchada
um rasto de saliva
na garganta

Pedir-te que me dispas
e me deites
de borco e os meus seios
na tua cara

Pedir-te que me olhes
e me aceites
me percorras
me invadas
me pressintas

Pedir-te que me peças
que te queira
no separar das horas
sobre a língua

Maria Teresa Horta, As Palavras do Corpo, Dom Quixote, Lisboa, 2012.

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Poesia X- Manuel Alegre

Carta a Sophia
ou
o quinto poema do português errante

Querida Sofia: como os índios do seu poema
também eu procurei o país sem mal.
Em dez anos de exílio o imaginei
como os índios utópicos também eu queria
um outro Portugal em Portugal.
Mas quando regressei eu não o vi
como eles me perdi e nunca achei
o país sem mal.
Talvez a própria vida seja isto
passar montanha e mar sem se dar conta
de que o único sentido é procurar.
Como os índios do seu poema eu não desisto
sou um português errante a caminhar
em busca do país que não se encontra.

Manuel Alegre, Livro do Português Errante, Dom Quixote, Lisboa, 2001.

Edward Matthew Hale, The Mermaid's Rock, 1894

Os Lugares- José Cardoso Pires

"Caminho por quelhas atapetadas de mato que se há-de transformar em estrume e em viveiro de larvas depois de moído por botas cardadas, calores e invernias e, caminhando, cruzo-me com vultos, alguns chegados da Vila. Vejo interiores de casebres alumiados a petróleo, são uma espinha de traves coberta com telhas em escama. Cavernames de navio, é o que me lembram. Pequenas arcas de Noé. Num ou noutro há o gato e a criança de barriga nua e de pernas arqueadas, num ou noutro há o cachorro e a galinha presa pela pata a uma cadeira, e em grandes alguidares de folha remexem enguias pardacentas. A noite está tranquila, húmida talvez."

José Cardoso Pires, O Delfim, Dom Quixote, Lisboa, 2002.