"Amália Ruiz encontrou a paixão da sua vida no corpo e na voz de um homem proibido. Durante mais de um ano viu-o chegar febril à beira da sua saia, que saía voando depois de um abraço. Não falavam muito, conheciam-se como se tivessem nascido no mesmo quarto, e um simples roçar dos seus agasalhos causava-lhes estremecimento e ditas. O resto saía-lhes dos seus corpos felizes com tanta facilidade que, pouco tempo depois de se encontrarem, no quarto dos seus amores soava a Sinfonia Pastoral e cheirava a perfume como se Coco Chanel o tivesse inventado.
Aquela glória mantinha as suas vidas suspensas e convertia a sua morte num impossível. por isso, eram belos como um feitiço e promissórios como uma fantasia.
Até que, numa noite de Outubro, o amante da tia Meli chegou ao encontro atrasado e a falar de negócios. Ela deixou-se beijar sem paixão e sentiu o hálito da habituação devastando-lhe a boca. Guardou para si as censuras, mas saiu a correr para casa e nunca mais quis saber daquele amor.
- Quando o impossível se quer transformar em rotina, é preciso abandoná-lo - explicou à irmã, que não era capaz de entender uma atitude tão radical. - Não podemos embarcar na história de ambicionar uma coisa proibida, de a possuir às vezes como uma bênção, de a desejar sobretudo por isso, por ser impossível, desesperada, e de um momento para o outro vê-la converter-se no anexo de um escritório. Não posso permiti-lo, não vou permiti-lo. Seja por amor de Deus que algo tem de proibido e por isso é abençoado."
Angeles Mastretta, Mulheres de Olhos Grandes, Edições Asa, Lisboa, 2003.
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